ANECRA reúne 600 profissionais em convenção histórica sobre o futuro do setor automóvel

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Mais de 600 participantes marcaram presença na 36ª Convenção da ANECRA, que debateu os maiores desafios da próxima década: escassez de técnicos qualificados, preços desajustados da mão de obra e o papel da Inteligência Artificial na transformação do pós-venda automóvel português.

Dia 28 de novembro, o Centro de Congressos de Lisboa foi palco de um momento histórico para o setor automóvel português. A 36ª Convenção da ANECRA registou um recorde absoluto de participação, com mais de 600 profissionais — desde marcas e importadores a oficinas, comércio de usados e empresas de financiamento — unidos para debater o tema "Setor automóvel rumo a um futuro mais inteligente".

Num ano em que a ANECRA celebra 115 anos de existência, a convenção reforçou o papel da associação como epicentro da renovação estratégica do setor. A mensagem de abertura foi clara: "Confiamos no setor automóvel português, que sempre foi capaz de se adaptar, inovar e reinventar-se". Mas a confiança não basta. É preciso agir.

A crise silenciosa que ameaça o pós-venda

O painel da manhã trouxe à luz aquilo que muitos especialistas consideram o maior desafio das últimas décadas: a escassez crítica de mão de obra qualificada. Sem técnicos especializados, as oficinas enfrentam quedas de produtividade, perdas financeiras e tempos de resposta cada vez mais longos.

Tiago Rocha, da Tiagorochauto, sintetizou o problema de forma direta: "As oficinas têm medo de apostar nos jovens". Este receio está a criar um círculo vicioso. Os jovens que saem dos centros de formação não encontram oportunidades de desenvolvimento nas empresas, enquanto as oficinas continuam desesperadas por profissionais experientes que já não existem em número suficiente.

Nuno "Wheelhouse" Reis, administrador da Redeinnov, foi mais longe: "No futuro, será cada vez mais caro recrutar, porque os profissionais existem no mercado, mas há um grande problema na contratação. A solução passa por formar internamente e reter talento."

O preço da mão de obra: um problema estrutural

Mas a escassez de técnicos é apenas parte do problema. O desajuste entre o preço da mão de obra e a complexidade crescente dos veículos está a comprometer a sustentabilidade financeira das oficinas.

De acordo com o Inquérito de Conjuntura da ANECRA, o preço médio horário da mão de obra é de 52€ nas oficinas de marca e apenas 32€ nas independentes. Valores que muitos consideram incompatíveis com as exigências técnicas atuais e com a necessidade de investimento constante em formação e equipamentos.

Tiago Firmino Ribeiro, managing director da Solera, foi categórico: "Sem um preço de mão de obra ajustado, não poderá haver uma remuneração ajustada. E sem remuneração ajustada, não haverá profissionais no setor."

Inteligência Artificial: aliada ou ameaça?

A Inteligência Artificial foi outro tema central da convenção. Desde diagnósticos automáticos através de fotografia até ferramentas de gestão avançada, a IA promete revolucionar o pós-venda automóvel.

Raúl González Martin, CEO & Founder da Somos Movilidad, apresentou dados do mercado espanhol que revelam como a digitalização e a IA estão a trazer mais eficiência às oficinas. No entanto, sublinhou que "é preciso que as empresas olhem para a gestão como algo importante, de modo a que as oficinas saibam mais sobre a sua rentabilidade".

Tiago Ribeiro reforçou o consenso geral: "A decisão final continua a depender do ser humano". A tecnologia pode apoiar, acelerar e optimizar, mas a experiência e o julgamento humano permanecem insubstituíveis — pelo menos por enquanto.

Economia circular e sustentabilidade: o projeto Peça Verde

A transição sustentável também marcou presença nos debates. Vítor Pereira, presidente da ANCAV, apresentou o projeto Peça Verde, que certifica peças usadas com garantia de rastreabilidade e qualidade.

Esta iniciativa contribui para a economia circular no setor automóvel e aumenta a confiança dos consumidores numa altura em que a redução de emissões e a sustentabilidade são cada vez mais determinantes. Para muitos operadores presentes, apostar em peças verdes deixará de ser uma opção e passará a ser uma necessidade estratégica.

Mercado de usados e regulação europeia no centro das atenções

O mercado de viaturas usadas, que importa anualmente 120 a 130 mil veículos, foi outro tema em destaque. Muitas destas importações servem para suprir a falta de oferta no segmento de novos, mas o setor enfrenta agora regulação iminente que poderá alterar profundamente os modelos de negócio estabelecidos.

O debate sobre a indústria automóvel europeia trouxe alertas sobre a pressão crescente de metas ambientais ambiciosas, hiper-regulamentação e concorrência global desequilibrada — especialmente da China. A necessidade de um enquadramento regulatório mais realista e competitivo foi amplamente discutida.

Prémios ANECRA 2025: reconhecimento à excelência

A Convenção encerrou com a entrega dos Prémios ANECRA 2025, que distinguiram personalidades e entidades que contribuíram para a evolução do setor:

Pós-venda automóvel LDAuto
Comércio de viaturas usadas Grupo MCoutinho
Comércio de viaturas novas Benecar
Projeto/Personalidade do Ano Grupo Motorpor / Manuel Coutinho
Carreira Esmeralda Dourado

A 36ª Convenção da ANECRA deixou uma mensagem clara: o setor automóvel português está a viver um momento de transformação profunda. A inteligência — seja artificial ou humana — será determinante para navegar os desafios da próxima década. Mas sem investimento em pessoas, formação e condições dignas de trabalho, nenhuma tecnologia salvará o setor.

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